A ILUSÃO DA CONSISTÊNCIA



"O homem não é permanentemente igual a si mesmo.
 A velha concepção dos caracteres retilíneos e 
das mentalidades cristalizadas 
em sistemas imutáveis abriu falência. 

Tudo muda no espaço e no tempo.
Para um organismo vivo, existir é ... transformar-se.

Quando começamos cedo e envelhecemos na atividade das letras, 
não há em nós apenas um escritor. 
Houveram escritores sucessivos, múltiplos e diversos, 
representando estados de evolução 
da mesma mentalidade incessantemente renovada.

Ao chegar a altura da vida em que a estabilização se opera, 
olhamos para trás, 
e muitas das nossas próprias obras parecem-nos escritas por um estranho,
já tão longe se encontram, 
não apenas dos nossos processos literários, 
mas do nosso espírito, das nossas tendências, 
da nossa orientação, dos nossos pontos de vista éticos e estéticos.

Nesse exame retrospectivo, por vezes doloroso, 
se de algumas coisas temos de louvar-nos, 
de outras somos forçados a reconhecer a  pobreza da concepção, 
os vícios da linguagem, as carências da técnica, 
e tantas vezes as audácias, as incoerências, as injustiças, 
as demasias, a licença de certas pinturas de costumes 
e o erro de certas atitudes morais.

É preciso re-começar - bem o sei - na literatura como na vida!

...O nosso organismo é uma máquina, gasta-se, como todas as máquinas;
 e, por milagre da natureza, 
ainda é aquela que, funcionando permanentemente, 
consegue durar mais tempo.

... A vida não é só o entusiasmo dos moços, nem só a reflexão dos velhos; 
não está apenas na audácia de uns, nem apenas na experiência de outros, realiza-se pela magnífica integração das virtudes contrárias, 
sem a qual não seria possível, 
em todo o seu esplendor, a marcha da humanidade."


(  Júlio  Dantas,  in "Páginas de Memórias" )


Muitos Beijinhos de Gratidão 


3 comentários:

Paulo Francisco disse...

Interessante este texto. Estou aqui a pensar.
Um beijo grande

Aclim disse...

A vida não é só o entusiasmo dos moços, nem só a reflexão dos velhos;

Quem dera fosse
Abraço

SIMONE PRADO disse...

E o que seria a vida? Um simples passar, ou um caminhar em conjunto ou sozinho, no escuro de um ser solitário? Ah! Nem sei, é de tudo um pouco ou nada de quase tudo! Seu texto é muito intenso, nos faz para para refletir e isso é muito legal. O ser humano devia se perguntar mais e falar menos, talvez assim acharíamos as respostas. Bjos. Lindo o texto e benéfico

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